Quando a gente fala de empreendedorismo feminino, quase sempre aparecem as palavras coragem, criatividade e resistência. Agora, quando juntamos isso à ideia de empreendedorismo verde, a conversa ganha ainda mais força — porque estamos falando de mulheres que não só sustentam seus negócios, mas também sustentam o futuro.
O empreendedorismo verde não é só sobre vender produtos ecológicos ou criar negócios “da moda”. É sobre um jeito diferente de pensar e agir: reduzir desperdícios, reaproveitar materiais, cuidar da terra, pensar em processos que respeitem o meio ambiente e as pessoas. É economia, mas também é afeto e responsabilidade coletiva.
O que significa empreender verde?
Antes de falar das mulheres, vale pensar no próprio conceito. Empreender verde não é simplesmente pintar um negócio com o rótulo de sustentável para atrair consumidores conscientes. É muito mais profundo. Significa rever a forma como produzimos, consumimos e nos relacionamos com a natureza.
É olhar para o impacto que uma empresa tem no meio ambiente e na sociedade e escolher caminhos diferentes: usar materiais reciclados, apostar em energia limpa, incentivar a economia circular, reduzir plástico, cuidar dos resíduos, valorizar a produção local.
E o mais importante: é entender que o lucro não pode ser o único objetivo. Empreender verde é também sobre propósito, sobre alinhar valores pessoais e coletivos com aquilo que se coloca no mundo.
O protagonismo das mulheres
E quem aparece na linha de frente dessas iniciativas? Muitas vezes, as mulheres.
Isso não é coincidência. Existe uma ligação histórica entre o trabalho feminino e o cuidado — com a casa, com a comunidade, com a terra. Essa mesma lógica atravessa o empreendedorismo verde.
Quando olhamos para negócios sustentáveis, é comum ver mulheres agricultoras, artesãs, pesquisadoras, comunicadoras e líderes comunitárias criando soluções que unem sobrevivência econômica e responsabilidade ambiental.
Penso aqui em quantas histórias poderíamos contar:
- A agricultora traz alimentos agroecológicos para a feira local, garantindo comida saudável e cultivada sem venenos.
- A artesã que transforma tecidos que seriam descartados em moda com identidade e resistência.
- A jovem que cria cosméticos veganos na cozinha de casa, misturando ciência e ancestralidade.
- As mulheres em periferias que organizam mutirões de reciclagem e cooperativas de catadoras, reinventando a relação com os resíduos urbanos.
Todas elas, de algum jeito, fazem do cuidado um negócio.
Ecofeminismo na prática
Existe um conceito que ajuda a pensar essa ligação: o ecofeminismo. Ele parte da ideia de que as opressões de gênero e a exploração da natureza estão conectadas. Em outras palavras, o mesmo sistema que desvaloriza o trabalho das mulheres também degrada o meio ambiente.
Quando mulheres empreendem de maneira sustentável, muitas vezes estão praticando ecofeminismo sem nem usar esse nome. Estão mostrando, na prática, que existe outro modelo possível: mais justo, mais circular, mais respeitoso.
É como se fosse um movimento de resistência silencioso, mas muito potente. Porque ao mesmo tempo em que desafia o modelo econômico tradicional, também abre espaço para novas formas de vida e de produção.
Desafios e barreiras
Mas é claro que não dá para romantizar. O caminho das mulheres no empreendedorismo verde também está cheio de barreiras.
Muitas enfrentam dificuldade de acesso a crédito e investimento. Outras esbarram na falta de apoio técnico, de capacitação ou de políticas públicas que realmente incentivem a sustentabilidade. Sem falar na dupla jornada, já que grande parte ainda precisa conciliar o cuidado da família com o trabalho fora de casa.
E existe ainda o peso do machismo, que insiste em colocar o empreendedorismo feminino como algo menor, “complementar”, quando na verdade essas iniciativas movimentam economias locais inteiras.
Por isso, falar de empreendedorismo verde feminino também é falar de política pública, reconhecimento e valorização. Não basta admirar as mulheres que estão à frente desses negócios. É preciso criar condições para que elas cresçam e permaneçam.
Exemplos que florescem
No Brasil, existem inúmeras iniciativas inspiradoras.
Podemos pensar nas mulheres que atuam nas feiras agroecológicas espalhadas pelo país, levando produtos cultivados sem agrotóxicos. Muitas dessas feiras são lideradas por agricultoras que não apenas vendem, mas também fortalecem redes de apoio e de consumo consciente.
Na moda, encontramos marcas criadas por mulheres que trabalham com upcycling, transformando retalhos em peças novas, ou que usam fibras naturais cultivadas de forma sustentável.
Na área de cosméticos, o movimento de beleza limpa também tem rosto feminino: mulheres produzindo sabonetes, cremes e shampoos veganos, livres de crueldade animal e embalagens plásticas.
São negócios pequenos, muitas vezes artesanais, mas com um impacto enorme. Eles desafiam a lógica do descartável e mostram que é possível produzir com cuidado e responsabilidade.
Por que precisamos falar disso?
Quando olho para essas iniciativas, vejo que o empreendedorismo verde feminino é mais do que uma tendência: é um chamado. Um chamado para repensarmos consumo, mercado, futuro.
Não é só sobre mulheres ganhando autonomia financeira. É também sobre propor uma nova forma de existir em comunidade. É sobre economia solidária, justiça climática, resistência cultural.
E é também sobre nós, enquanto sociedade, reconhecermos o valor dessas práticas. Porque muitas vezes, negócios sustentáveis femininos não recebem a mesma visibilidade ou apoio que grandes startups recebem. Mas são justamente eles que estão construindo alternativas reais e possíveis.
O futuro que queremos
Talvez a pergunta seja: como podemos apoiar esse movimento?
Alguns caminhos parecem claros: valorizar o consumo local, escolher comprar de mulheres que empreendem com consciência, divulgar essas iniciativas, cobrar políticas públicas que incentivem a economia verde.
Mas também é sobre mudar nosso olhar. Entender que empreender verde sendo mulher é um ato político. É dizer que existe outro jeito de viver, produzir e sonhar. E que esse jeito pode — e deve — florescer.
No fim das contas, o empreendedorismo feminino verde é uma mistura de sobrevivência, inovação e afeto. Ele nasce muitas vezes da necessidade, mas se transforma em propósito. É sobre transformar restos em futuro, escassez em criatividade, cuidado em potência.