Maria é costureira, trabalhando em sua casa. Ela faz peças inteiras e reparos. Por trabalhar de casa e ter alta demanda de entregas, seus horários nunca são muito bem definidos. Maria cuida sozinha da sua casa, seus dois filhos de sete e dez anos e seu ateliê. Sua rotina de trabalho dura cerca de catorze horas. A ansiedade vive à flor da pele pelos prazos apertados e a falta de descanso. Apesar do volume de trabalhos, o orçamento não permite a contratação de um funcionário para delegar funções e aliviar o peso. Passou a sentir dores de cabeça e enjôos com frequência. O ar começou a pesar nos pulmões. As entregas começaram a atrasar. A exaustão a impedia de manter o ritmo. E isso só alimentou mais a ansiedade, a culpa, a auto-cobrança. Até que o corpo de Maria acendeu todos os alertas e parou. Acabou indo para o hospital com os sinais da pane física e emocional. As entregas pararam totalmente. Era necessário recuperar a mente e o corpo antes de voltar.
Maria foi diagnosticada com a Síndrome de Burnout, caracterizada pelo estado de esgotamento emocional, físico e psicológico relacionado ao trabalho. Significa “combustão total” e atinge milhares de empreendedoras em todo o mundo. Os sintomas variam em cada pessoa, mas alguns costumam ser mais comuns. No corpo, pode aparecer como dores de cabeça frequentes, sensação de cansaço extremo mesmo sem esforço físico intenso, enjôo, azia, insônia, e mais uma imensa lista. No emocional, pode aparecer como dificuldade de concentração, a sensação de estar no automático, no sentimento de fracasso e na crescente ansiedade.
Segundo o estudo “Saúde e Performance de Pessoas Empreendedoras” elaborado pela Endeavor Brasil em colaboração com o BID Lab em 2024: 94,1% dos fundadores de startups relataram ter vivido pelo menos uma condição adversa de saúde mental ao longo da jornada empreendedora, com a ansiedade sendo a mais frequente (85,6%), seguida por burnout (37%), depressão (21%) e ataques de pânico (22%).
Com a inserção das mulheres no empreendedorismo, frequentemente carregam a crença no “mito da mulher perfeita”. Aquela que dá conta de tudo sozinha e sem reclamar. Que toca seu empreendimento com a harmonia de um maestro enquanto mantém todas as outras áreas da sua vida diária girando impecavelmente como os pratos de um equilibrista.
Vivemos em uma sociedade patriarcal, onde o gênero funciona como um alicerce binário: é esperado que homens sejam independentes e individualistas, enquanto das mulheres se exige afeto, cuidado e interdependência. Essa construção social pesa sobre os ombros femininos — especialmente quando empreendem — porque o trabalho não termina na porta do ateliê ou do negócio. Continua em casa, nos filhos, nos cuidados com a família, nas demandas invisíveis que parecem “naturais” para quem é mulher. Mas não são.
Muitas mulheres empreendem não por vocação, mas por falta de opções. O empreendedorismo feminino, especialmente no Brasil, é muitas vezes impulsionado pela necessidade: desemprego, maternidade sem rede de apoio, ou trabalhos formais que não permitem conciliar a vida pessoal. Assim, empreender se torna um caminho de sobrevivência — e não de liberdade imediata.
Segundo uma pesquisa realizada pela International Stress Management Association (ISMA-BR), 32% das mulheres brasileiras em atividade profissional sofrem com sintomas da Síndrome de Burnout. Elas representam a maioria dos diagnósticos — reflexo da sobrecarga física, emocional e mental enfrentada diariamente.
O cansaço faz parte de todas as rotinas, mas no Burnout ele ultrapassa os limites, causando adoecimento – tanto do corpo quanto da mente. Despersonalização, como se estivesse ausente de si mesmo. Resistência ao trabalho e baixa no desempenho.
Se você se identificou com o texto até aqui, saiba que não está sozinha. Então eu te convido a reconhecer que não somos robôs. Somos seres humanos, assim, temos necessidades básicas como descanso e diversão. O seu negócio precisa de você inteira para crescer.
Exercício prático
1. Separe o urgente do importante
Com seu papel e caneta ou bloco de notas do celular, separe três colunas
- Urgente e importante – Tarefas para fazer já.
- Importante, mas não urgente – Tarefas para programar o tempo de fazer
- Urgente, mas não importante – Delegue a tarefa
Seja sincera com você mesma, o objetivo é se planejar e evitar a sobrecarga.
2. Defina os limites
Uma lista de tarefas realista, que estabeleça as prioridades para cada dia, pode ser uma bússola importante (o exercício anterior ajudará a fazê-la). Determine também um horário de fim do expediente mesmo que você trabalhe em casa. Lembre-se que isso também é autocuidado.
3. Seu momento de pausa
As tarefas continuarão surgindo sempre, mas descansar é, para além de uma estratégia para continuar vivo, uma maneira de ser verdadeiro consigo mesmo.
Defina ao menos 30 minutos semanais para uma atividade de descanso. Seja ler um livro que não tenha a ver com trabalho, um banho premium relaxante, ou mesmo sentar para ver o pôr do sol com um cházinho. O importante é descansar sem culpa.
4. Procure um profissional de saúde mental
O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece atendimento gratuito a toda população, iniciando o atendimento pelas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Além disso, algumas Universidades e Faculdades oferecem esse atendimento gratuito ou a preço acessível. Vale a pena procurar a opção que mais se adapta a você.
5. Faça parte de uma rede de troca
Pode ser um grupo de Whatsapp, um encontro mensal online, uma reunião presencial, o importante é compartilhar. Um espaço para trocar desabafos, comemorar vitórias e aprender umas com as outras.
O objetivo, aqui, é trazer a reflexão sobre a necessidade de pausar para não se sobrecarregar. É importante ressaltar que o diagnóstico da síndrome de Burnout deve ser feito por um profissional de saúde mental.
Para fazer agora mesmo
Responda no papel, ou apenas reflita com calma:
- De 0 a 10, como estou me sentindo hoje?
- O que meu corpo está dizendo (ou sentindo)?
- O que posso ajustar na minha rotina hoje para me colher?
Cuidar de si não é egoísmo — é estratégia de resistência. Que a sua jornada empreendedora seja feita com coragem, mas também com pausa, escuta e respiro. Afinal, é preciso estar viva para seguir criando.
Você, empreendedora, o que tem funcionado em sua rotina para evitar a sobrecarga? Compartilha conosco! Estamos no Instagram e Facebook com conteúdos fresquinhos toda semana. Você também pode receber nosso conteúdo por email, assinando a Newsletter.